O Poder das Crenças e a sua abordagem em Coaching
“Eu acredito que cada um dos meus clientes é uma pessoa única, criativa e com todos os recursos para fazer as mudanças que entenda necessárias, rumo à sua felicidade. Enquanto Coach, sinto-me honrada por poder participar neste processo de desenvolvimento da sua vida.”
Esta frase faz parte da minha minuta de “Contrato de Coaching” que eu assino com os meus clientes, e traduz, de uma forma muito clara, uma convicção ou, se quisermos, uma “crença”: “Eu acredito que cada pessoa é única, criativa, e que dispõe de todos os recursos que precisa para realizar as mudanças que decidir fazer na sua vida.”
Mas em que é que eu me baseio para afirmar isto com tanta convicção? Naturalmente esta é uma ‘boa’ convicção porque nos conduz a um processo de descoberta desses recursos na relação de parceria que estabelecemos com os nossos clientes. Mas todas as crenças terão este efeito? E como é que elas surgem na nossa vida? E será que podemos eliminar crenças existentes e substituí-las por novas crenças? É este trabalho que me proponho realizar: responder a estas perguntas, com a ajuda preciosa de três autores: António Damásio, Bruce H. Lipton e José Figueira.
As crenças são as nossas “verdades” construídas ao longo da vida, e são de dois tipos muito diferentes:
As crenças de sinal positivo (+) são chamadas “Crenças Libertadoras” porque nos remetem para as múltiplas possibilidades criadas pelos novos ângulos ou prismas de observação da realidade. Este tipo de crenças dá-nos poder e força para produzirmos mudanças nas nossas vidas, refletindo-se na nossa fisionomia e nas nossas atitudes: pessoas em que dominam as crenças libertadoras são mais enérgicas, mais positivas e com mais capacidade de realização. Exemplo de crenças positivas podem ser também frases deste género:
– eu sei que sou capaz!
– eu não sou pessoa de desistir!
– eu acredito que tudo é possível, desde que eu queira!
– eu acredito que todos os problemas têm uma solução;
– eu estou sempre do lado da solução e nunca do problema.
As crenças de sinal negativo (-) são chamadas “Crenças Limitadoras” porque nos limitam e reduzem as possibilidades de observação da realidade. Este tipo de crenças retira-nos força e poder para
enfrentarmos qualquer tipo de mudança necessária na nossa vida, refletindo-se na nossa fisionomia e nas nossas atitudes: pessoas em que dominam este tipo de crenças, são mais passivas, menos positivas e com menor capacidade de realização. Exemplo de crenças negativas ou limitadoras podem ser frases deste género:
– eu gostava de … mas sei que não consigo;
– eu não acredito que seja possível;
– eu só vejo problemas na minha vida;
– eu tenho tendência a ver sempre o lado negativo de qualquer coisa;
– eu tenho medo de me expor;
– eu vou fazer isso mas já sei que não vai resultar.
1. Como se formam as Crenças?
Começo pelo princípio, que neste caso é um livro: “A Biologia da Crença” de Bruce H. Lipton, biólogo celular, investigador na área das células clonadas e um dos cientistas pioneiros da nova biologia ou Epigenética. Nesta obra, Bruce Lipton apresenta todas as descobertas relacionadas com o estudo das células, de uma forma cronológica, terminando com a apresentação das suas próprias evidências científicas sobre a forma como todas as nossas células são afetadas pelos processos bioquímicos do funcionamento do cérebro – ou seja, como os nossos pensamentos provocam alterações nas nossas células. Esta afirmação não é de somenos importância, pois se as nossas células são influenciadas pelo exterior (neste caso por processos bioquímicos produzidos no cérebro), isto também quer dizer que os nossos genes e o nosso ADN também são influenciados pelos inputs que recebem do meio ambiente/exterior às células. Então, uma primeira e grande conclusão para a humanidade, é que nós, humanos, não estamos fatalmente determinados a ser desta ou daquela maneira devido à nossa herança genética ou ao nosso ADN. Sim, é verdade que os genes refletem à nascença o nosso “potencial”, mas somos nós que decidimos ao longo da vida o nosso destino!
Esta evidência científica da Epigenética, entretanto corroborada pela Neurociência, é particularmente importante para percebermos como é que se formam as primeiras crenças nos primeiros seis anos de vida de qualquer Ser Humano. Para isso, transcrevo do capítulo 7 – Parentalidade Consciente, algumas frases elucidativas deste processo.
“A evolução dotou os nossos cérebros com a capacidade de carregar rapidamente um número inimaginável de crenças e comportamentos na nossa memória. Podemos compreender melhor como funciona este carregamento rápido, analisando a atividade elétrica, flutuante, do cérebro, conforme medida nos eletroencefalogramas. Estas imagens, cada vez mais sofisticadas, revelam uma gama graduada de atividade cerebral nos seres humanos. Tanto os adultos como as crianças, exibem variações nos EEG que vão das ondas ‘delta’ de baixa frequência, até às ondas ‘beta’ de alta frequência. No entanto, os investigadores notaram que a atividade EEG nas crianças, revela, em cada estádio de desenvolvimento, predominância de uma onda cerebral específica!
• Entre o nascimento e os 2 anos, o cérebro humano opera predominantemente na frequência mais baixa do EEG (0,5 a 4 ciclos por segundo (Hz) conhecida por ondas ‘delta’;
• Entre os 2 e os 6 anos, a criança começa a gastar mais tempo num nível superior de atividade EEG caracterizada como ‘teta’ (4-8 Hz)
Para percebermos melhor o efeito destas ondas ‘teta’ é preciso acrescentar que os hipnoterapeutas reduzem a atividade cerebral dos seus pacientes para “teta” porque as ondas cerebrais de baixa frequência colocam-nos num estado mais sugestionável e programável. As crianças observam atentamente o seu ambiente, e descarregam diretamente na memória subconsciente o conhecimento do mundo proporcionado pelos pais. Em consequência, o comportamento e as crenças dos pais tornam-se as delas. Dada a precisão deste sistema de gravação de comportamento, podemos imaginar as consequências de ouvir uns pais a dizer “és um estúpido”, “nunca serás ninguém na vida”, “és uma flor de estufa…”.
Durante a fase inicial de desenvolvimento, a consciência da criança não está suficientemente desenvolvida para avaliar de forma crítica essas afirmações dos pais ou familiares. Em consequência, estes insultos tornam-se “verdades” que, inconscientemente, moldam o comportamento e potencial da criança ao longo da vida.”
Agora que já sabemos como é que se formam as crenças nos primeiros anos de vida, é fácil percebermos que, utilizando o mesmo processo podemos criar nas nossas crianças, crenças de sinal positivo como por exemplo: “tenho tanto orgulho em tí”; “vês como consegues!”; “podes ser tudo o que tu quiseres”.
Mas… e estas crenças negativas que são instaladas nos primeiros anos de vida, podem ser eliminadas ou substituídas na idade adulta? A resposta é sim! Vamos ver como…
2 – Que efeito têm as crenças na perceção da realidade?
Para responder a esta pergunta, recorro à PNL – Programação Neuro Linguística, e em particular ao seu “Modelo de Comunicação” que nos explica a forma como apreendemos a realidade que nos cerca.
O Modelo de Comunicação em PNL assenta no postulado básico da “impossibilidade de conhecermos diretamente o Mundo”. “O Mundo é na sua essência, irreconhecível. Apresenta-se-nos através dos cinco sentidos como estímulos externos na forma de imagens, sons, cheiros, sensações táteis e paladares, e são reconhecidos pelos nossos sistemas representacionais: o visual, o auditivo, o cinestésico, o olfativo e o gustativo. A informação que se nos apresenta do exterior através dos 5 sentidos, sofre uma série de transformações. Esta informação é submetida a um processo contínuo de distorções, generalizações e omissões que funcionam como “filtros”. Estes filtros são os responsáveis pela nossa maneira pessoal de olhar a realidade e de estar no Mundo, ou seja, são o nosso Mapa do Mundo.” in Ciência e Arte da PNL de José Figueira
Debrucemo-nos agora sobre estes filtros e o seu impacto na forma como vemos o Mundo. Estas operações mentais têm um papel muito importante e útil. Senão vejamos:
– Omitir estímulos externos permite-nos selecionar a informação que nos interessa mais;
– Generalizar permite-nos sintetizar grandes blocos de informação em níveis, classes ou categorias;
– Distorcer permite-nos criar novas realidades com base na informação antiga.
Tudo isto é “funcional” exceto quando o fazemos de forma subconsciente ou em “piloto automático”, o que sucede em 95% do nosso tempo (Szegedy-Maszak, 2005 e António Damásio, 2010). Sim, a mente consciente só “dirige o espetáculo” nos restantes 5% do nosso tempo. Em consequência, perdemos informação valiosa, vemos-ouvimos-sentimos o que não está lá, e acreditamos que as nossas generalizações são factos e não abstrações linguísticas, com efeitos trágicos como por exemplo, o racismo, a xenofobia, a discriminação social, etc.
As crenças fazem parte destes filtros, em paralelo com as recordações, os valores, as convicções e as atitudes. Com estes filtros criamos a nossa “representação Interna” da realidade. Não é a Realidade, é a nossa realidade ou Mapa do Mundo, que por sua vez nos remete para estados emocionais que se refletem na nossa fisionomia e definem os nossos comportamentos.
Se estes filtros ou lentes deixarem passar a luz e o sol, teremos mais hipóteses de nos tornarmos pessoas mais atentas, otimistas e confiantes. Se estes filtros ou lentes escurecerem a nossa realidade, seremos provavelmente mais pessimistas e inseguros nas nossas decisões. O sinal positivo ou negativo das nossas crenças é determinante para o tipo de lentes com que encaramos a realidade. A boa notícia é que estas lentes podem ser mudadas!
3 – Mudar os Programas
Nós somos pessoalmente responsáveis por tudo o que sucede na nossa vida, a partir do momento em que nos apercebemos de que somos responsáveis por tudo o que sucede na nossa vida!”. Bruce H. Lipton
Escolhi esta frase porque ela remete para um momento muito importante nos processos de Coaching: o momento em que os clientes se tornam conscientes de algo, que até aí não se revelava à sua consciência. Há um “antes” e um “depois”, sempre que isto acontece.
No ponto anterior falei de mente consciente e mente subconsciente. Explico resumidamente:
A mente subconsciente é sobretudo um grande armazém de conhecimento com origem nos instintos e nas experiências vividas no passado. É um programa comportamental com milhões de dados armazenados e sempre disponíveis no nosso dia a dia. A herança genética e as crenças e comportamentos adquiridos através de pais, professores e meio ambiente, compõem uma base de dados gigante, sempre disponível e prioritária para nos indicar qual o comportamento para cada estímulo. É a mente subconsciente que nos dita o que fazer e o que pensar em 95% dos nossos atos. É também, e por isso, chamada de “Piloto Automático”. É aqui que residem todas as crenças!
A mente consciente – que representa a sede da nossa identidade pessoal, origem ou espírito – é a mente criativa. Consegue ver o futuro, passar em revista o passado, ou desligar-se do momento presente enquanto resolve problemas na nossa cabeça. Graças à sua capacidade criativa, a mente consciente guarda os nossos desejos, anseios e aspirações para a vida. É a mente que conjura os nossos “pensamentos positivos”. A mente consciente, apesar de só estar ativa em 5% dos nossos atos, apresenta ainda duas características extraordinariamente importantes:
• é autorreflexiva, ou seja, é um órgão sensorial que observa os nossos próprios comportamentos e emoções;
• tem acesso à maior parte dos dados armazenados no nosso banco de memória (subconsciente).
Armada desta capacidade de autorreflexão, a mente consciente é extremamente poderosa! Pode observar qualquer comportamento programado que estejamos a ter, avaliá-lo e decidir conscientemente alterar a programação! Nós podemos escolher se queremos reagir à maioria dos sinais ambientais, e como queremos reagir-lhes. Esta capacidade da mente consciente para prevalecer sobre os comportamentos programados da mente subconsciente constitui a base do livre-arbítrio. Chegados aqui, já podemos responder à última pergunta que fizemos no início desta reflexão:
– E será que podemos eliminar crenças existentes e substituí-las por novas crenças?
Sim. Podemos! Somos possuidores de uma mente consciente que nos ajuda a identificar pensamentos (crenças) e comportamentos pré-programados. Essa mesma mente consciente ajuda-nos também a criar o hábito necessário à construção de uma nova Crença de sinal positivo, que anula e substitui a anterior (em linguagem computacional, diríamos que se trata de instalar uma nova versão de crenças e comportamentos). Claro que este processo não é simples muito menos rápido.
Depois de identificada uma crença “limitadora” e de tomada uma decisão de a substituir, é preciso tempo para processar a mudança.
Sobre este “tempo”, transcrevo a explicação dada por António Damásio, n’O Livro da Consciência”
“A deliberação consciente prende-se, em grande medida com decisões tomadas no decurso de grandes períodos de tempo, dias ou semanas no caso de algumas decisões…. A deliberação consciente tem a ver com a reflexão ponderada. Aplicamos a reflexão e o conhecimento quando decidimos questões importantes da nossa vida. Usamos a deliberação consciente para reger os nossos amores e amizades, a nossa educação, as nossas atividades profissionais, as nossas relações com os outros.”
E ainda “… a maioria das decisões importantes são tomadas muito antes do momento da execução, na mente consciente, na altura em que é possível simulá-las e testá-las, e onde o controlo consciente possibilita, potencialmente, minimizar o efeito das predisposições não-conscientes.”
4. Conclusões
Claro que nada disto é novo. Qualquer profissional de Coaching sabe que as mudanças precisam de tempo para o cliente fazer a transição do seu EA-Estado Atual para o seu ED-Estado Desejado.
Aqui, o que me parece importante de destacar é a importância que o Coach tem neste processo:
– Contribuir para que o cliente saia do seu “piloto automático” e aceda à sua mente consciente para identificar as crenças, assim como os ganhos e as perdas da sua existência enquanto tal;
– Contribuir para a elaboração de um plano que conduza à substituição dessas crenças por outras de sinal positivo e mais funcionais;
– Acompanhar o cliente durante todo o processo, pois como vimos atrás, a mente consciente precisa de tempo para fazer as suas simulações criativas daquilo que quer mudar, mesmo antes de iniciar o processo de mudança ou transição.
Chegados aqui, creio que se torna muito claro que, sendo este um dos temas que nos surge com mais frequência nas sessões de Coaching, merecia e merece a nossa atenção e o nosso conhecimento mais aprofundado. Espero que este pequeno trabalho contribua para esse melhor conhecimento.
Enquanto Coaches profissionais, em formação contínua, temos necessidade de aprofundar todos os temas que nos chegam às sessões de Coaching trazidos pelos nossos clientes. Só assim garantimos um nível de excelência que esses clientes esperam de nós.
Bernardete Santos
Deixe um comentário
Quer juntar-se a discussão?Sinta-se à vontade para contribuir!